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Open Banking inicia 2ª fase com cliente desconfiado, fintechs animadas e bancos atentos para não perder terreno

Denise Ramiro

O Open Banking avança mais um passo rumo ao novo sistema bancário que promete empoderar o cliente final e levar oportunidades de negócios para o sistema financeiro. Entra hoje em operação a segunda fase do Open Banking, na qual o cliente poderá compartilhar seus dados pessoais de cadastro (nome completo, CPF/CNPJ, telefone, endereço e dados de transações relativas aos produtos e serviços de suas contas) com outra instituição que não seja a que já tem conta, em busca das melhores ofertas para as suas necessidades bancárias. Assim, poderá contratar serviços avulsos de outras instituições, sem a necessidade de ter uma conta bancária no banco do serviço tomado, desburocratizando o processo.

“O discurso utilizado pelo sistema financeiro sempre é o de beneficiar o usuário final. Sabemos que nem sempre essa é a prioridade. Porém, no caso do Open Banking parece que o caminho seguido beneficiará mais o cliente final do que os próprios bancos”, diz Caio Bretones, fundador e CEO da Mobile2you, mobile-house que desenvolve aplicativos financeiros sob medida e que, apenas nos últimos três anos, criou mais de 50 bancos digitais para seus clientes.

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Na avaliação do consultor, professor e escritor especializado em fintechs Bruno Diniz, o Open Banking ajudará a nivelar um pouco mais o ambiente competitivo entre fintechs e outras instituições financeiras, como os bancos. “A gente começa a ter a possibilidade de que esses novos entrantes entendam mais rápido o perfil dos potenciais novos consumidores e possam entregar produtos cada vez mais customizados para eles”, diz Diniz.

Consumidor curioso e ressabiado

A expectativa com o novo sistema desenvolvido pelo Banco Central é grande para todos os atores envolvidos – bancos, fintechs e consumidores. Do lado do consumidor, há o interesse pela novidade, mas também preocupação com a segurança dos seus dados. A pesquisa “Open Banking Brasil”, realizada, entre os dias 4 e 10 de junho último, pela Tecban/Ipsos para entender hábitos, percepções e sentimentos do consumidor em relação a temas financeiros e de Open Banking, mostrou que 66% da população considera relevantes os novos serviços que podem surgir com o Open Banking (em 2019 eram 58%). Outra revelação positiva é que sete em cada 10 brasileiros dizem possuir interesse em novos formatos de pagamento, assim como 71% responderam que se sentem à vontade para usar tecnologia nova.

Um ponto frágil do processo, apontado no levantamento da Tecban/Ipsos, é a questão da segurança. A preocupação com o compartilhamento de dados é alta, apontada por 46% das pessoas. Mas a desconfiança já foi maior, em 2018 eram 60% de consumidores ressabiados, sendo que as maiores preocupações recaem sobre os crimes financeiros (os dados serem acessados por criminosos) e a forma como os dados serão usados pelas instituições que receberem o compartilhamento de dados do cliente.

O diretor de Inovação da Febraban, Leandro Vilain, disse na terça-feira, durante evento sobre Open Banking para a imprensa, que o novo sistema traz várias camadas de segurança. Segundo ele, é o cliente quem decide quais os dados quer compartilhar, para qual finalidade e por quanto tempo — não há prazo mínimo, só máximo, que é de 12 meses. “O novo sistema não terá base centralizada de dados, as informações só fluirão entre a instituição tomadora e a receptora de dados”, afirma Vilain. 

Além disso, acrescenta o executivo da Febraban, as instituições financeiras registradas na nova plataforma seguem regras rígidas do regulador e outras tantas internacionais que garantem o nível de segurança ao consumidor.

Para o líder do grupo de trabalho de Open Banking na Febraban, Ivo Mósca, outra garantia para o consumidor final sobre os seus dados é que ele pode encerrar o compartilhamento na hora que quiser. “Uma vez cessado o compartilhamento, a instituição não pode mais acessar os dados, mesmo que eles fiquem registrados no sistema, e ficam, porque é uma exigência do regulador o armazenamento de dados por cinco anos”, explica Mósca.

Desafios e recompensas

O Open Banking promete revolucionar o mercado financeiro, o que de certa forma já está acontecendo no país desde o surgimento das fintechs, que transformaram o ambiente bancário ao oferecerem uma outra experiência ao usuário a partir da inovação, competitividade e inclusão. Com o novo sistema, as fintechs poderão fazer com mais precisão o que já fazem, oferecer inovação, bancarização e crédito para quem teve pouco ou nenhum acesso ao sistema bancário.

Os bancos também serão beneficiados pelo Open Banking com a reciprocidade e a troca de dados, também poderão ter acesso a um potencial cliente que está em outro banco ou até mesmo ao próprio cliente que ele não tem acesso a todas as informações, mas que poderá ter se fizer uma oferta atrativa a ele. “De forma geral, os bancos vão ter que correr muito atrás em termos de reter a base atual de clientes, como tentar expandir em cima de serviços melhores, mais customizados e inovadores, que, inclusive, já é a forma como o mercado está funcionando”, diz Diniz.

Na opinião de Bretones, da Mobile2you, se os bancos tradicionais não se esforçarem para criar produtos e preços competitivos, os clientes da sua base poderão absorver produtos e serviços financeiros dos seus principais concorrentes. Segundo ele, nos bancos mais tradicionais a tendência é a resistência, uma vez que poderá haver canibalismos de ofertas mais interessantes de serviços financeiros que seus clientes podem contratar em outras instituições. “Portanto, enfrentaremos uma fase de abertura do mercado com opções de serviços que podem ser contratados sem fricção, gerando uma equalização do mercado e  forçando os bancos tradicionais a se reinventarem”, diz Bretones.

O Banco Central programou o lançamento do sistema em quatro fases

1 Desde 1/02, foram abertos os dados das instituições participantes, seus canais de atendimento e os produtos e serviços que oferecem – como contas de depósito à vista, poupança, pagamento e operações de crédito. Essa 1ª fase não envolve o compartilhamento de dados de clientes.

2 De 13/08 a 29/8, o cliente poderá compartilhar e autorizar seus dados pessoais de cadastro, como nome completo, CPF/CNPJ, telefone, endereço e dados de transações relativas aos produtos e serviços de suas contas.

3 Prevista para começar em 30/08, marca o início do pagamento fora do ambiente do banco via Pix. Clientes poderão ter acesso a serviços como pagamentos e propostas de crédito por um aplicativo de mensagem, por exemplo.

4 Programada para começar em 15/12, nessa etapa será possível o compartilhamento de outros dados de produtos e serviços, como informações relacionadas a operações de câmbio, investimentos, seguros e previdência.

Cronograma para 2022 (previsão)

15/2: compartilhamento de serviços e transferências entre contas do mesmo banco e TED
30/3: compartilhamento do envio de propostas de operações de crédito a clientes que  aderirem ao open banking
31/5: compartilhamento de dados de clientes sobre demais operações financeiras, como câmbio, investimentos, previdência e seguros
30/6: compartilhamento de serviços de pagamento por boleto
30/9 – compartilhamento de serviços de débito em conta

Fonte: Febraban

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