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Fábio Póvoa, ex-Movile e iFood, ensina como empreender e investir em startups

Denise Ramiro

Quando o investidor anjo Fábio Póvoa, de 45 anos, vendeu a sua participação na Movile, dona do iFood, para o empresário ricaço Jorge Paulo Lemann, ganhou dinheiro suficiente para adquirir sua independência financeira. “Foi o meu evento de liquidez. Dá para dizer que com o negócio passei a não precisar mais trabalhar para pagar a escola das crianças e o aluguel no final do mês”, conta Póvoa. Mas isso não significa ficar parado. Na época, ele havia acabado de retornar ao Brasil após dois anos no Vale do Silício, na Califórnia, onde fez um MBA sobre lean (enxuta) startup, uma metodologia de criação e gestão de startups. Com dinheiro no bolso, resolveu mudar o foco dos negócios, passando de empresário para investidor anjo. “Eu era alguém com experiência empreendedora, mas ser um bom jogador não te faz um bom técnico. Um bom empreendedor não faz de você um bom investidor”, diz Póvoa.

No comando da Smart Money Venture, Póvoa tem hoje 12 startups no seu portfólio — e muita experiência prática e teórica para escolher as melhores oportunidades para apoiar. Ele atua em duas frentes nesse ambiente de inovação tecnológica. Uma delas é através de um curso que ministra na Unicamp, onde se formou em Engenharia da Computação, no qual ensina jovens talentos a se tornarem empreendedores. Segundo Póvoa, o empreendedor precisa de aprendizados mais sofisticados do que apenas conceitos técnicos, como os de validação de ideias, de marca, de atração, de internacionalização e de outras disciplinas que a computação não fornece.

Em outra frente de atuação, Póvoa lidera um grupo de investidores — pessoas ricas, herdeiros, empresários, executivos, jovens, idosos, aposentados do setor público com altos rendimentos, mulheres, ex-empreendedores, gestores de family office, que colaram nele atrás de bons negócios, network e credibilidade de quem colocou no mercado empresas que viraram unicórnios. Muitos deles participaram de palestras e cursos para investidores ministrados por Póvoa. “Eles querem aproveitar o meu imã de atração de startups, mas também o meu conhecimento no processo de análise e validação de oportunidades de negócios em estágio inicial”, conta Póvoa.

Tese de investimento


A Smart Money Venture parte de uma tese de investimento que levanta questões como em qual nicho e estágio do negócio está a startup candidata a receber apoio. A tese da Smart Money é liderar rodadas privadas de investimento de capital semente em startups nos segmentos de fintech, edtech (educação), HRtech (Recursos Humanos) e SaaS B2B, conjugando recursos, conhecimento, experiência, melhores práticas, gestão de portfólio e networking para alavancar o crescimento exponencial. Em relação ao estágio de desenvolvimento da candidata aos recursos, a Smart Money tem na sua tese investir em startups que estão faturando entre R$ 25 mil e R$ 30 mil, que já têm receita, portanto, produtos, base de clientes, máquina de vendas e que possa crescer dez vezes em dez anos. Segundo Póvoa, a tese de investimento é feita justamente com critérios técnicos e teóricos para não ficar ao sabor da moda do momento.

Cada rodada tem a participação de investidores seletos do seu clube de investidores, o K-Pool, que contam com planejamento, tese de investimento, fluxo de oportunidades em captação, alocação garantida de capital em rodadas lideradas e ativa gestão de portfólio com reportes trimestrais e engajamento para apoiar o amadurecimento e crescimento das startups investidas.

De combustível a igrejas


Os dois últimos investimentos da Smart Money aconteceram agora em julho, com recursos destinados à Gasola, sistema que conecta gestores de frota, motoristas e postos de combustíveis, e na inChurch, plataforma líder em aplicativos e tecnologias de comunicação, engajamento e gestão de organizações religiosas. Nesse último caso, por exemplo, Póvoa entra em um mercado promissor. Focado no mundo cristão, contempla cerca de 170 milhões de pessoas e movimenta R$ 40 bilhões ao ano no Brasil.

De acordo com Póvoa, a inChurch oferece soluções para resolver as principais necessidades do dia a dia das comunidades religiosas. Atualmente, é a maior empresa de tecnologia deste setor no país, com 700 mil usuários cadastrados, que dá cobertura a milhões de membros e visitantes dessas organizações. A projeção é de que nos próximos quatro meses, com novos contratos, serão mais 2 milhões de usuários cadastrados. A plataforma permite que a igreja realize missas online, venda produtos como livros, palestras, e na ponta final funciona como uma fintech, que capta o dízimos e contribuições esporádicas dos fieis.

Oportunidade x ideia


Os acertos da Smart Money são menores do que os erros, ao que Póvoa atribui a sua tese de investimento. “Cometi erros, como investir na ideia de um empreendedor que é muito bom de palco. O investidor de risco deve investir na oportunidade, não na ideia”, ensina o investidor anjo. E os sinais de oportunidades, segundo ele, já podem ser analisados no estágio embrionário da startup.

Ele conta que é comum o investidor acreditar que o fundador de uma startup esteja num estágio avançado, tenha feito um progresso muito grande, porque já tem a marca, o logotipo, o website e os primeiros clientes. Mas, isso tudo é pouco para a Smart Money colocar dinheiro nela. “Não preciso de um investimento anjo para poder registrar a marca, fazer um aplicativo, uma campanha de marketing no Facebook ou no Google para testar o seu canal de atração, sua máquina de vendas. Mas de uma startup a um IPO na bolsa de valores tem muitas etapas e necessidades de recursos”, diz ele.

O empreendedor que é um bom candidato a aportes anjos deixa a ideia de lado para apresentar uma oportunidade para o investidor. “Ele chega com uma visão mais holística, quando já sabe o tamanho do mercado, tem uma solução funcionando, uma base de cliente, canais de atração, assim como já sabe onde pescar esse cliente e passá-lo por uma jornada na qual ele conhece, se engaja, testa, pilota e paga por ele”, diz Póvoa.

Acertos e erros


Da dúzia de startups no portfólio da Smart Money, três já foram vendidas para o mercado, o negócio mais recente foi a Gama Ensino, comprada pelo grupo Anima, com várias universidades no Brasil. A única empresa investida até agora que não deu certo foi a Best Berry, que fazia assinatura de snacks naturais. Depois de investir, conta Póvoa, ele viu que o mesmo produto era oferecido pelo Pão de Açúcar e a Mãe Terra, e assim a startup não encontrou um mercado receptivo. “Mais do que vingar a ideia, é preciso validá-la”, diz Póvoa.

Antes de qualquer rodada, o investidor anjo submete o empreendedor a uma análise crítica de um expert do nicho do negócio à vista. Também faz uma diligência sobre o empreendedor para ver se ele tem nome sujo, se já cometeu crime, se a empresa tem todos os impostos pagos, se está constituída. “É uma parte relativamente simples, mas importante, porque a gente está noivando para um casamento de longo prazo”, diz ele.

Apesar disso, Póvoa faz questão de dizer aos investidores de risco, que como o próprio nome diz, risco é parte do negócio. Segundo ele, o investidor no estágio inicial é credor em um contrato de empréstimo mútuo, com valores, juros e prazo. E faz um alerta em caso da empresa investida quebrar. Ele explica que o investidor provavelmente terá que perdoar o empréstimo, mas não será corresponsável por pagar o passivo trabalhista e tributário que aquele fundador deixou para trás. “No fracasso você é um credor que não vai receber o seu capital, precisa saber desse risco, no sucesso, você vira acionista preferencial, pago com ações daquela sociedade anônima”, finaliza ele.